sábado, 4 de agosto de 2012

Projeto APcoop nas Cooperativas Agrícolas do Rio Grande do Sul



Introdução

Nas últimas décadas, o setor agropecuário tem passado por profundas transformações. O interesse em maximizar a produção tem estimulado os produtores a adotarem práticas avançadas de manejo da cultura e do solo. A obtenção de elevados rendimentos é uma necessidade em função dos altos custos de produção e a crescente competitividade a que todos os produtores estão sujeitos no mundo a cada dia mais globalizado. No entanto, de nada adianta o produtor utilizar as mais diferentes alternativas tecnológicas, se não utilizar de forma racional os recursos disponíveis, na busca da rentabilidade de sua atividade. Portanto, as inovações tecnológicas devem vir acompanhadas de rentabilidade ao produtor.
Nesse sentido, a agricultura de precisão se propõe a aumentar a eficiência e a rentabilidade da atividade agropecuária, com base no manejo localizado respeitando a variabilidade de solo, planta e microclima existente na área (Amado & Santi, 2007). Para Dobermann & Ping (2004), a agricultura de precisão é uma forma moderna de gerenciamento da atividade agrícola que objetiva aplicar os insumos no local correto (espaço), no momento adequado (tempo), nas quantidades necessárias (quantidade) à produção e com a fonte correta, para áreas cada vez menores e homogêneas tanto quanto a tecnologia e os custos envolvidos permitam manter a rentabilidade.
Os trabalhos em agricultura de precisão têm se concentrado sobre o manejo da variabilidade de atributos químicos do solo, pois em várias situações de campo, os benefícios gerados trazem ganhos imediatos tanto na racionalização no uso de insumos como na elevação da produtividade. No entanto, muitas vezes, o entendimento dos usuários de agricultura de precisão limita-se a aplicação de insumos a taxa variada sem mesmo investigar se esse é realmente a principal causa da variabilidade da produtividade em sua área (Amado & Santi, 2007).
Em alguns casos, parece que o uso da agricultura de precisão fica atrelado como sendo privilégios de poucos produtores capitalizados devido aos custos envolvidos na amostragem intensiva de solo, análises de laboratório de solo e plantas, aquisição de distribuidores de fertilizantes à taxa variada, colhedoras equipadas com sensores de rendimento, consultoria técnica para geração de mapas, entre outros. Nesse sentido, é importante desmistificar isso e entender a agricultura de precisão como sendo uma ferramenta tecnológica de gerenciamento que pode direcionar a utilização dos fatores de produção conduzindo ao aprimoramento do manejo na busca da eficiência produtiva. O aprimoramento do gerenciamento é uma necessidade atual de todas as propriedades agrícolas, independente do seu tamanho ou capacidade de investimento. Através do melhor gerenciamento dos talhões que compõem a propriedade agrícola obtem-se maior eficiência e retorno econômico. Entretanto, é importante, segundo Pires et al. (2004), que se tenha consciência de que os benefícios esperados com a agricultura de precisão são dependentes de fatores como variabilidade encontrada em cada área, tecnologia, condições climáticas e soluções de manejo empregadas, entre outras.
Aliado a isso é imprescindível que o usuário da agricultura de precisão mantenha-se atento ao adequado manejo dos demais fatores de produção, também muito importantes na busca de eficiência e competitividade da sua atividade. O rendimento de grãos de uma cultura qualquer é o resultado da interação entre vários fatores. Alguns estudos que visam a identificar os fatores determinantes do rendimento de grãos quantificam-nos em 52, entre controláveis e incontroláveis. Destes, 45 são controláveis e sete, representados, por exemplo, por precipitação pluvial, temperatura e concentração de gases na atmosfera, somente podem ser manejados indiretamente (Tisdale et al., 1993; Summer, 2009).
A adoção massiva de novas práticas de manejo é sempre difícil, principalmente quando estas representam modificações em práticas consolidadas e tradicionais (Pires et al., 2004). Para os autores, a adoção e a disseminação do sistema plantio direto no Brasil foram marcadas por dificuldades e incertezas. A agricultura de precisão passa pela mesma situação, principalmente quando usada em condições diferentes daquela para a qual foi concebida (países desenvolvidos, agricultura subsidiada, politica agrícola definida). Adaptações e inovações são necessárias para o sucesso da agricultura de precisão em países em desenvolvimento, e acredita-se que as pesquisas participativas envolvendo produtores, empresas privadas, universidades e institutos de pesquisa são essenciais. Neste contexto, ressalta-se a importância do Projeto Aquarius (www.ufsm.br/projetoaquarius) para o avanço da agricultura de precisão no Rio Grande do Sul. Este projeto ao longo de dez anos de sua existência tem desenvolvido conhecimento e validou equipamentos e tecnologias para o Sul do Brasil.
A CCGL/Fundacep como Centro de Experimentação e Pesquisa do sistema cooperativo do Rio Grande do Sul está empenhada na busca de uma agropecuária mais sustentável, tendo sido uma das instituições que contribuiu para a adoção do plantio direto. No caso da agricultura de precisão, certamente existirão muitas limitações tecnológicas a serem superadas no processo de adoção. No entanto, acredita-se que a integração de esforços, juntamente com o trabalho desenvolvido por outras instituições, possibilitará a transferência e validação de tecnologias, que certamente contribuirão para tornar a agricultura de precisão uma realidade.

O Projeto Cooperativo de Agricultura de Precisão  – APcoop

A agricultura de precisão alia tecnologia (máquinas, equipamentos, eletrônica embarcada, geotecnologias, programas computacionais e pessoal especializado) com conhecimento. Neste sentido a CCGL/Fundacep em parceria com a UFSM (Setor de Uso, Manejo e Conservação do Solo e Água e Laboratório de Geomática) implementou um projeto de apoio visando estimular a adoção da agricultura de precisão no sistema cooperativo do RS.
Os principais objetivos do Projeto Cooperativo (APcoop) são:
  • Fornecer susbsídios técnicos ao sistema cooperativo através da realização de cursos e treinamentos em agricultura de precisão;
  • Implementar um programa de pesquisa em agricultura de precisão em áreas pilotos junto às cooperativas mantenedoras;
  • Estimular a troca de experiências e parcerias entre cooperativas e instituições.
Principais Atividades Desenvolvidas e Abrangência do APcoop
Um conjunto considerável de ações que a CCGL/Fundacep e a UFSM tem desenvolvido no programa de apoio a adoção da agricultura de precisão pelo sistema cooperativo do RS. Observou-se uma motivação significativa ao processo de adoção e a necessidade de repassar informações básicas sobre o tema. Foram realizados em 2007, 2008 e 2009, vários cursos e treinamentos, que ocorreram em módulos por assunto de interesse, abordando aspectos técnicos relativos aos procedimentos envolvidos, objetivando qualificar os assistentes técnicos das cooperativas envolvidas. Os primeiros itens desenvolvidos foram: tamanho de malha para amostragem de solo, profundidade de amostragem, tempo para reamostragem, teores críticos de nutrientes no solo, doses a serem aplicadas à taxa variada, retorno econômico, treinamento especifico com Software Campeiro 6.0 na geração de mapas de atributos de solo e de prescrições de intervenções de manejo localizado, treinamento com empresas parceiras do Projeto Aquarius em mapas de rendimento e distribuidores à taxa variada e interpretação de resultados. Adicional a isto, inúmeras palestras e dias de campo foram realizados objetivando desmistificar e esclarecer aos produtores associados das cooperativas envolvidas, o potencial que agricultura de precisão representa na atual conjuntura.
Também foram realizadas reuniões de capacitação dos departamentos técnicos das cooperativas com os professores Telmo Amado e Enio Giotto (UFSM) e o com pesquisador Jackson E. Fiorin, em Cruz Alta (RS).
Segundo a avaliação do Coordenador do Projeto APcoop, Jackson E. Fiorin, os resultados são animadores, pois até o momento, 15 cooperativas já estão estruturadas e oferecendo esta ferramenta tecnológica aos seus associados. É oportuno relatar que, anterior a isto, algumas cooperativas por iniciativa própria já tinham adotado a agricultura de precisão como uma prioridade nas suas ações e pioneiramente iniciado atividades em alguns produtores.
Além do treinamento da equipe técnica especializada em agricultura de precisão, as cooperativas investiram na aquisição de equipamentos para amostragem de solo (quadriciclos), distribuidores à taxa variada, GPS, penetrômetros (avaliar o estado de compactação do solo) e sensores de rendimento. Estes equipamentos pelo seu custo seriam inacessíveis aos pequenos produtores, porém quando adquiridos pela cooperativa, que presta esse serviço, adicionalmente aos outros serviços que já tradicionalmente oferece, se torna viável. Além disso, os pequenos produtores associados da Cotrijal (Não-Me-Toque), receberam algumas noções sobre os conceitos de agricultura de precisão e informações sobre a aplicação de fertilizantes à taxa variada, através do departamento técnico da cooperativa. Sem isso, esses produtores não poderiam ter os benefícios dos avanços tecnológicos. Outro fator que favorece o desenvolvimento da agricultura de precisão nas cooperativas é que a evolução do gerenciamento e controle das atividades agrícolas é gradativa necessitando algumas safras para que todos os fatores limitantes ao rendimento sejam minimizados. Para tanto, faz-se necessário um acompanhamento técnico freqüente ao produtor durante algumas safras. Isso é possível através dos departamentos técnicos das cooperativas.
Na Cotripal (Panambi), que iniciou os trabalhos em 2007, vários produtores relataram que suas lavouras ficaram mais uniformes. O Engo Agro Dênio Oerlecke, Supervisor da Área Técnica, explica que muitos produtores escolhem um talhão das suas áreas para experimentar a tecnologia, mas já no ano seguinte optam por expandir para os demais talhões.
Com base num levantamento de informações prestadas pelos departamentos técnicos das cooperativas vinculadas à CCGL/Fundacep, a agricultura de precisão no sistema cooperativo do RS já conta com a adesão de 894 produtores. A abrangência desse processo de adoção no sistema cooperativo pode ser melhor visualizada na Figura 1, e encontra-se distribuída em 90 municípios do RS. A área em que efetivamente já foi utilizado algum tipo de ferramenta de gricultura de precisão totaliza aproximadamente 81.556 hectares.
Figura 1. Área de abrangência da adoção da agricultura de precisão no sistema cooperativo do RS. Fundacep. Cruz Alta, RS, 2009.

A condução das áreas de pesquisas em parceria da CCGL/Fundacep e UFSM servirá de base na geração de informações, bem como tem papel importante em adaptar a tecnologia para as diferentes realidades de propriedades na área de abrangência das cooperativas, inclusive desenvolvendo conhecimento em outras áreas relacionadas. As áreas de pesquisas são constituídas normalmente em áreas de produtores, associados de cooperativas, vinculadas a CCGL/Fundacep. Até o momento são em numero de 18 áreas de pesquisa distribuídas em diferentes regiões do Estado.
A aplicação de fertilizantes à taxa variada e em tempo real utilizando sensores é um assunto ainda novo no Brasil. Através das parcerias multi-institucionais esta tecnologia está sendo avaliada em áreas de milho e trigo no RS. O conceito por trás desta tecnologia é de que as informações referentes ao estado nutricional da cultura são obtidos diretamente a campo, momentos antes da aplicação. Além disto, o número de informações que se obtém por hectare é muito elevado, podendo resultar em 250 a 300 doses de taxa variada em um único hectare de acordo com a variabilidade encontrada no campo. Outro aspecto é que não envolve análises de laboratório pois o estado nutricional é determinado indiretamente por sensores óticos. Na Figura 2 é apresentada uma das primeiras áreas no Brasil onde este conceito de fertilização foi implementado. O N-sensor foi importado da Alemanha em 2009 pela Yara e disponibilizado ao Projeto Aquarius. Um importante trabalho de engenharia entre técnicos da Yara e da Stara possibilitaram a comunicação do sensor com o distribuidor, de modo que em uma só passada na lavoura se obtenha o diagnóstico e a aplicação. Agora a pesquisa agronômica precisa comprovar a eficiência da tecnologia comparada com as tradicionais.

Figura 2. Experimento com aplicação de nitrogênio à taxa variada e em tempo real com o N-Sensor na cultura do milho. Reunidos técnicos da Stara (distribuidor de fertilizante), Yara (N-Sensor), UFSM e Fundacep (pesquisadores), Massey Ferguson e Cotrijal.


Neste programa de apoio à adoção da agricultura de precisão no sistema cooperativo, a CCGL/Fundacep viabilizou a ampliação e modernização do laboratório de análises de solo. A modernização do laboratório de solos resultou em várias melhorias na infra-estrutura, na aquisição de aparelhos de última geração e na construção de um novo laboratório análises de solos. A nova estrutura projetada objetiva ampliar o número de amostras realizadas e qualificar os seus resultados, mas, prioritariamente, propõe reduzir o tempo entre o recebimento da amostra e a emissão do laudo de análise. Esse é um fator essencial para agricultura de precisão pois o espaço entre a amostragem do solo e a intervenção à taxa variada é pequeno.

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